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Quantas questões serão anuladas no exame de ordem desse domingo?

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Bem, o Complexo Renato Saraiva, enviou-nos uma longa correspondência digital e a perspectiva é de uma anulação. Talvez surjam outras, mas - hoje - eles estão impugnando a questão 42 do Caderno Amarelo.

Questão Impugnada – Questão 42 da Prova Amarela



Comentários do XI Exame de Ordem por Cristiano Sobral, Luciano Figueiredo e Roberto Figueiredo

Questão Impugnada – Questão 42 da Prova Amarela
Diante de chuva forte e inesperada, Márcio constatou a inundação parcial da residência de sua vizinha Bianca, fato este que o levou a contratar serviços de chaveiro, bombeamento d’àgua e vigilância, de modo a evitar maiores prejuízos materiais até a chegada de Bianca.

Utilizando-se do quadro fático fornecido pelo enunciado, assinale a afirmativa correta:

a) A falta de autorização expressa de Bianca a Márcio para a prática dos atos de preservação dos bens autoriza aquela a exigir reparação civil deste.

b) Bianca não estará obrigada a adimplir os serviços contratados por Márcio, cabendo a este a quitação dos contratados.

c) Se Márcio se fizer substituir por terceiro até a chegada e Bianca, promoverá a cessação de sua responsabilidade, transferindo-a ao terceiro substituto.

d) Os atos de solidariedade e espontaneidade de Márcio para proteção dos bens de Bianca são capazes de gerar responsabilidade desta em reembolsar as despesas necessárias efetivadas, acrescidas de juros legais.

Segundo o gabarito oficial da FGV, a resposta correta é a letra “d”. Todavia, inexiste artigo específico do Código Civil aplicável ao caso, bem como não há jurisprudência dominante do Superior Tribunal de Justiça sobre o assunto. Portanto, o gabarito fornecido não possui base legal, ou jurisprudencial. Acresça-se a isto que o edital do certame autoriza apenas a utilização de jurisprudência sumulada, ou dominante. Nada disto ocorreu.

Ademais, em uma análise do direito posto, não há como se imputar falsidade a alínea “b”. Vejam-se os fundamentos:

a) O Princípio da Relatividade dos Efeitos do Contrato impõe que este apenas obriga as partes contratantes. Logo, se Márcio contratou os serviços de chaveiro, bombeamento d’àgua e vigilância, ele que haverá de adimplir pelos mesmos.
Assim, não há como obrigar a Bianca (uma terceira) a cumprir, ou indenizar o cumprimento, de um contrato que fora confeccionado entre Márcio (contratante) e os prestadores de serviços (contratados). Se assim o fosse, terceiros seriam corriqueiramente executados por contratos que sequer fazem parte.
Registra-se que é neste sentido que caminha a doutrina nacional. A título de exemplo, cita-se a doutrina de Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho[1]:

Regra geral, os contratos só geram efeitos entre as próprias partes contratantes, razão por que se pode afirmar que a sua oponibilidade não é absoluta ou erga omnes, mas, tão-somente, relativa.

Não é diverso o posicionamento de Silvio do Salvo Venosa[2]:


A regra geral é que o contrato só ata aqueles que dele participem. Seus efeitos não podem, em princípio, nem prejudicar, nem aproveitar a terceiros. Daí dizemos que, com relação a terceiros, o contrato é res inter alios actas, aliis neque nocet neque potest.



Mas isto não é tudo!

b) A questão, em nenhum momento, informa que a referida inundação seria apta a causar algum tipo de risco ao imóvel de Márcio. Com efeito, a expressão prejuízos materiais referida no enunciado não é clara, ao passo que não informa se tais prejuízos são referentes ao bem de Márcio ou de Bianca.
Nesta intelecção, não há como obrigar o candidato a saber quem sofreu os alegados prejuízos materiais. Destarte, Bianca pode desejar a ruína do seu imóvel próprio, desde que não cause prejuízo a terceiros. Não pode, portanto, Bianca ser obrigada a ressarcir Márcio, por ter este desejado conservar o imóvel dela, sem saber, ao certo, se este era o desejo daquela.
Caso, porém, os prejuízos materiais fossem de Márcio, então este teria interesse jurídico para agir e, haja vista o seu risco patrimonial próprio, poderia exigir a reparação de Bianca. Tal fato, porém, em nenhum momento é narrado na questão.
Havendo, portanto, a veracidade da assertiva “b”, e porque o gabarito oficial não possui base em lei ou jurisprudência pacificada, pleiteia-se a invalidação da questão.
 

[1] In Novo Curso de Direito Civil. Contratos. Volume IV. 4 Edição. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 40.
[2] In Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos. 8 Edição. São Paulo: Atlas, 2008. p. 361.

Pelo menos esses professores se posicionam e tratam o exame de ordem como se ele existisse, como de fato existe. 


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